ANDERSON GUERRA
BASEADO EM ARGUMENTO
DE CHARLES DEEMER.
FADE IN:
# CENA 1 – EXT. TARDE
Viajante
solitário andando em fim de tarde. O dia vai escurecendo, o sol se pondo. Ele
carrega um embornal e tem um aspecto cansado como quem caminha há vários dias.
Mas os passos e o olhar são firmes.
(TRAVELLING)
# EM OFF “Houve um tempo em que a eletricidade não fazia parte da realidade do ser humano. As noites eram longas e traziam consigo o maior inimigo do homem: O medo. Então veio o fogo, mudando para sempre a vida em
grupo, transformando bandos de homens e mulheres em aldeias, cidades, países.
Logo de início as aldeias se viram totalmente dependentes do fogo. Passaram a
viver melhor, descobrindo dia a dia novas formas de alimento. O frio ficou
mais suportável e a escuridão já não assustava tanto. O tempo passou, mas a
questão era: Como manter as chamas acesas?
E foi assim que surgiram os guardiões da luz”. |
CORTA PARA:
# CENA 2 – EXT. NOITE
O viajante se assusta ao ouvir barulho na mata. De
repente o barulho revela-se.
Surge um brutamontes de barba, cabelos compridos e
dentes podres carregando uma tocha acesa.
GUARDIÃO
Que fazes por estas terras, viajante? VIAJANTE
(EM PÂNICO) Acalma-te, acalma-te! Não venho fazer mal a vossa
gente! GUARDIÃO
(GARGALHANDO) Viajas aventurando-te pela escuridão da noite e te
assustas com esse pobre homem? VIAJANTE Venho em nome da minha aldeia, que fica a 5 dias e noites na direção de onde se põe o sol. Há muitas luas que perdemos nossas chamas com a chuva e nossas mulheres e crianças sofrem com a fome e o frio. Encarregado fui então de viajar por estas bandas em busca de fogo para meu povo. GUARDIÃO
E quanto ao
guardião da luz da tua aldeia? VIAJANTE
(JÁ SE AMBIENTANDO) Ah! Não possuímos tal privilégio.
Venho de terra pobre, desprovida de riquezas. GUARDIÃO
Já não me admira então que tenhas ficado sem fogo. Chamas
precisam ser guardadas. Pra isso existem guardiões. (PAUSA) |
O
guardião e o viajante se sentam ao redor de uma fogueira onde uma pequena ave
está sendo assada em um graveto.
GUARDIÃO
Serve-te que
aparentas estar estarvo. |
O viajante sem a menor
cerimônia se esbalda na comida e na água do guardião enquanto este olha-o
curioso.
VIAJANTE
Enfim gentil aldeão, venderás teu fogo a este infeliz viajante? GUARDIÃO Venderás... (REPETINDO CONFUSO) Venderás... não vejo significado em tal palavra. VIAJANTE Quero dizer, eh, darei-te moedas de ouro por troca do
fogo que porventura vier a me ceder. (SORRISO AMARELO) |
Viajante estende a mão
entregando ao guardião curioso, moedas de ouro.
GUARDIÃO
Troca?
Não compreendo-te! Porque haveria de pedir-te algo para servir-te do que a
natureza nos proviu? VIAJANTE Não conhecem dinheiro em tua aldeia então? (IRÔNICO) GUARDIÃO Apenas pela boca de outros viajantes como ti ouvimos
falar. (EM TOM DE CONFIDÊNCIA) Dizem que é a raiz de todo mal. VIAJANTE
Ah! Como viveis então, bom amigo? Como comprais o
pão que alimenta tua família? GUARDIÃO (ZOMBETEIRO) Comprais! Lá vem tu de novo com
palavras estranhas. Ora! Se necessito de pão apenas peço-o ao
padeiro. VIAJANTE Mas
haveria de dar-lhe algo também. GUARDIÃO Por
quê? VIAJANTE Ora!
Por ceder-te o pão. GUARDIÃO Veja bem, confuso amigo! Se quero peixe, vou ao peixeiro. Se necessitam de fogo, eles vêm a mim. VIAJANTE Mas caso se valessem de moedas como estas que agora
têm em mãos, poderiam medir o quanto cada um estaria cedendo ao outro. Assim,
se cedes mais fogo, tens consequentemente mais moedas e podes trocá-las por
ainda mais alimentos. GUARDIÃO (OLHA AS MOEDAS CONFUSO) Certo estou de que não
poderia me alimentar delas. VIAJANTE (JÁ ÍNTIMO) Sabes o que? Proponho-te um negócio. Sabes o
que é isso? (E EM SINAL NEGATIVO DO GUARDIÃO): Serias meu sócio. |
VIAJANTE
Acalma-te que te explico. Tu tens fogo e eu proponho
a sociedade. Vendemos tuas chamas por moedas de ouro. Em valor
ainda a ser determinado... (CONCLUINDO) ... dividimos as moedas. Meio a meio. GUARDIÃO
Mas que faço com tais moedas? VIAJANTE
(IRRITADO) Ora! Podes trocá-las pelo que quiseres ou
sonhares. Tua vida há de ser bem melhor. Serás rico e terás posses. GUARDIÃO
Mas o fogo é apenas algo que a tempestade traz a
floresta. Qualquer um poderia
possuí-lo. VIAJANTE
Não! Cercarás a floresta, tendo assim exclusividade
em seu acesso. GUARDIÃO
(ASSUSTADO) Há! Mas como posso delimitar algo que
pertence a todos? VIAJANTE
Pertencia caro amigo! Olhe ao teu redor, todas essas
terras haverão de ser tuas. |
Olhar
ganacioso surge no guardião e o viajante começa a entoar uma canção falando de
dinheiro. Guardião totalmente estupefato.
VIAJANTE
Olha, pega mais destas moedas pois serei teu
primeiro cliente. (PEGA SUA TOCHA NO CHÃO E ACENDE NA TOCHA DO GUARDIÃO)
Levarei o fogo, e junto as boas novas até minha aldeia. Mas voltarei e tu
serás o guardião mais rico de todos. |
O
viajante se levanta e sai apressadamente sumindo na mata.
O
guardião se levanta com sua tocha, sai andando pela floresta e depois de um
longo tempo de silêncio (TOMADO PELA GANÂNCIA) começa a tentar cantar a canção do viajante. Logo em seguida (VOLTANDO A SI), deixa as moedas caírem no chão, se volta para a camêra e diz:
GUARDIÃO
“O sol é fonte de toda luz, e junto ao céu e a terra
nos fornece o ar, a água, o alimento, a vida, enfim. (RESPIRA) De nada valem
riquezas mundanas diante da magnitude da natureza e da eternidade.” (TOMA AR,
E SOPRA COM FORÇA A TOCHA) |
FADE OUT.
10/2002